Em dias de incerteza para a sustentabilidade do nosso planeta torna-se urgente abraçar práticas que permitam o contínuo desenvolvimento de uma sociedade mais inclusiva, mais salutar e mais consciente. One Health (Uma só Saúde) surge como uma abordagem integrada e unificadora que reconhece a interconexão entre a saúde humana, a saúde animal e a saúde ambiental, propondo-se assim, como o caminho a seguir para um desenvolvimento planetário e comunitário mais sustentável.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), One Health deve ser entendido como “uma visão holística para enfrentar desafios complexos que ameaçam a saúde humana e animal, a segurança alimentar, a pobreza e os ambientes onde as doenças prosperam”. Ao promover uma estreita cooperação multidisciplinar entre profissionais de saúde humana, animal e ambiental, surgem mais valias significativas em múltiplas dimensões, nomeadamente em termos de saúde humana, saúde animal, economia, sociedade, ambiente e cultura.
Com a adoção de políticas de gestão públicas que promovem o One Health, a segurança e bem-estar de todos fica assegurada em diversos níveis, nomeadamente:
- Prevenção de Doenças
Havendo o reconhecimento de que a saúde humana está intimamente ligada à saúde dos animais e do meio ambiente, a crescente ameaça de doenças zoonóticas (doenças transmitidas entre animais e humanos, como gripe aviária, COVID-19, ébola, entre outras) é controlada com a deteção precoce de ameaças e doenças devido à implementação de uma resposta de biossegurança atempada e eficaz.
- Melhoria do Sistema de Saúde para Humanos e Animais
Atualmente, a resistência antimicrobiana (RAM) é um dos maiores desafios de saúde pública global. De acordo com a Comissão Europeia, a RAM é responsável por mais de 35 000 mortes por ano na União Europeia e estima-se que cerca de 70 % dos casos de infeções com bactérias resistentes aos antibióticos estão associados aos cuidados de saúde. Com a promoção da redução do uso excessivo de antibióticos é facilitada a melhoria do sistema de saúde animal e humano considerando as necessidades de ambas as partes, e permitindo o desenvolvimento de um sistema de saúde mais sustentável que preserve a eficiência dos medicamentos.
- Segurança Alimentar
De acordo com o Relatório European Union One Health de 2022 sobre Zoonoses, entre 2021 e 2022, verificou-se um aumento dos surtos de origem alimentar na UE em cerca de 44%. Ao garantir que a cadeia de produção e distribuição de alimentos de origem animal é saudável e sustentável, podemos ver um aumento do controlo na transmissão de doenças animais para os humanos, como é o caso da Salmonela e da Listeria. Permitindo não só diminuir o risco de doença por contaminação para humanos, mas também reduzir o risco de doenças para os animais envolvidos na cadeia alimentar dos humanos.
- Proteção Ambiental e Sustentabilidade
Com a promoção da gestão dos recursos naturais e uma interação sustentável entre os humanos e o ambiente, verifica-se uma redução da degradação ambiental, do desmatamento das florestas e das mudanças climáticas. Para além disto, com a conservação da biodiversidade e proteção dos ecossistemas verifica-se ainda uma redução do atual aumento de risco de doenças emergentes muitas delas zoonóticas. De acordo com a ONU, 75% das doenças emergentes são de origem zoonótica, o que de acordo com um estudo da revista BMJ Global Health está associado às alterações climáticas.
- Mais Conhecimento e Competência
Sendo One Health, uma abordagem holística e colaborativa entre setores (saúde humana, veterinária, agricultura e meio ambiente), desenvolve-se assim, uma maior qualidade e quantidade de informação que permite a melhoria do conhecimento e competências que facilitam a adoção de respostas mais eficazes em crises sanitárias globais.
- Aumento da Eficiência Económica
Ao integrar a saúde humana, animal e ambiental, verifica-se um aumento na prevenção de doenças e uso coordenado de recursos entre diferentes setores, o que implica uma redução dos custos associados a tratamentos de saúde e na gestão de crises seja em saúde humana, animal ou ambiental. Para além disto, desta integração entre saúde humana, animal e ambiental nasce um foco em investigação e investimento baseado na interdependência entre setores.
- Melhoria no Bem-estar
Ao promover o bem-estar pela integração da saúde humana, animal e ambiental, poderemos viver em ambientes mais saudáveis e com menor exposição a doenças zoonóticas, preservar ecossistemas, melhorar a segurança alimentar, reduzir o uso de antimicrobianos, adotar práticas mais sustentáveis e uma interação harmoniosa entre humanos, animais e o meio ambiente, gerando assim, uma melhor qualidade de vida com mais saúde para todos os envolvidos.
- Benefícios Sociais e Culturais
Com a crescente necessidade multidisciplinar para um desenvolvimento mais sustentável, criam-se oportunidades profissionais em áreas como saúde pública, veterinária e meio ambiente, estimulando o desenvolvimento de carreiras interdisciplinares. Para além disto, o incentivo para uma maior responsabilidade individual sobre a saúde coletiva e ambiental, contribuiu para a redução da pobreza e das desigualdades no acesso aos cuidados de saúde e segurança alimentar. A tomada de decisão baseadas em evidência científica cria políticas públicas mais justas e eficazes, promovendo a coesão social ao responsabilizar as comunidades locais pela preservação da saúde e dos recursos naturais.
Estas vantagens/mais valias demonstram a importância de adotar uma perspetiva integrada e cooperativa baseado no One Health para enfrentar os desafios de saúde pública global e promover o bem-estar de todas as formas de vida no planeta. Em virtude destes e outros benefícios, várias medidas e recomendações têm sido adotadas no seio da União Europeia e do Reino Unido, estando estas a posicionarem-se como atores importantes na promoção da saúde global, sustentabilidade e interconexão entre pessoas e animais.
Referências:
Adamson, S., Marich, A., & Roth, I. (2011). One Health in NSW: coordination of human and animal health sector management of zoonoses of public health significance. New South Wales Public Health Bulletin, 22(6), 105-112.
Asokan, G. V., Fedorowicz, Z., Tharyan, P., & Vanitha, A. (2012). One health: perspectives on ethical issues and evidence from animal experiments. EMHJ-Eastern Mediterranean Health Journal, 18 (11), 1170-1173, 2012.
Charron, D. F. (2012). Ecosystem approaches to health for a global sustainability agenda. EcoHealth, 9, 256-266.
Conrad, P. A., Meek, L. A., & Dumit, J. (2013). Operationalizing a One Health approach to global health challenges. Comparative Immunology, Microbiology and Infectious Diseases, 36(3), 211-216.
Decker, D. J., Siemer, W. F., Wild, M. A., Castle, K. T., Wong, D., Leong, K. M., & Evensen, D. T. (2011). Communicating about zoonotic disease: Strategic considerations for wildlife professionals. Wildlife Society Bulletin, 35(2), 112-119.
Hahn, S., Anandaraja, N., & D’Agnes, L. (2011). Linking population, health, and the environment: An overview of integrated programs and a case study in Nepal. Mount Sinai Journal of Medicine: A Journal of Translational and Personalized Medicine, 78(3), 394-405.
Häsler, B., Cornelsen, L., Bennani, H., & Rushton, J. (2014). A review of the metrics for One Health benefits. Rev Sci Tech, 33(2), 453-464.
Häsler, B., Hiby, E., Gilbert, W., Obeyesekere, N., Bennani, H., & Rushton, J. (2014). A one health framework for the evaluation of rabies control programmes: a case study from Colombo City, Sri Lanka. PLoS neglected tropical diseases, 8(10), e3270.
Jiménez, S., Pérez, A., Gil, H., Schantz, P. M., Ramalle, E., & Juste, R. A. (2002). Progress in control of cystic echinococcosis in La Rioja, Spain: decline in infection prevalences in human and animal hosts and economic costs and benefits. Acta tropica, 83(3), 213-221.
Mbugi, E. V., Kayunze, K. A., Katale, B. Z., Kendall, S., Good, L., Kibik, G. S., … & Matee, M. I. (2012). ‘One Health’infectious diseases surveillance in Tanzania: Are we all on board the same flight?. Onderstepoort Journal of Veterinary Research, 79(2), 01-07.
Meslin, F. X., & Briggs, D. J. (2013). Eliminating canine rabies, the principal source of human infection: what will it take?. Antiviral research, 98(2), 291-296.
Narrod, C., Zinsstag, J., & Tiongco, M. (2012). A one health framework for estimating the economic costs of zoonotic diseases on society. EcoHealth, 9, 150-162.
Richt, J. A., Webby, R. J., & Kahn, R. E. (2013). The pandemic H1N1 influenza experience. One Health: The Human-Animal-Environment Interfaces in Emerging Infectious Diseases: The Concept and Examples of a One Health Approach, 269-279.
Robinson, P. A., Epperson, W. B., Huston, C. L., Pace, L. W., Wills, R. W., & Cosby, A. G. (2012). Factors influencing diagnostic sample submission by food animal veterinarians in Mississippi. Vet Ital, 48, 31-9.
Schelling, E., Wyss, K., Bechir, M., Moto, D. D., & Zinsstag, J. (2005). Synergy between public health and veterinary services to deliver human and animal health interventions in rural low income settings. Bmj, 331(7527), 1264-1267.
Smith, G. G., Goebel, S. E., Culbert, C. R., & Guilbault, L. A. (2013). Reducing the public health risk of escherichia coli O157 exposure by immunization of cattle. Canadian Journal of Public Health, 104(1), e9-e11.
Veterinarians Without Borders (2010). – One Health for One World: a compendium of case studies. Available at: www. onehealthinitiative.com/publications/OHOW_Compendium_ Case_Studies.pdf (accessed on 10 July 2013).
World Bank (2012). – People, pathogens and our planet. Vol. 2. The economics of One Health. World Bank, New York. Available at: www-wds.worldbank. org/external/default/WDSContentServer/WDSP/IB/2 012/06/12/000333038_20120612014653/Rendered/ PDF/691450ESW0whit0D0ESW120PPPvol120web.pdf (accessed on 25 July 2013).
Zinsstag, J., Meisser, A., Schelling, E., Tanner, M., & Bonfoh, B. (2012). From’two medicines’ to’one health’and beyond: proceeding. Onderstepoort Journal of Veterinary Research, 79(2), 1-5.
Zinsstag, J., Schelling, E., Bonfoh, B., Fooks, A. R., Kasymbekov, J., Waltner-Toews, D., & Tanner, M. (2009). Towards a ‘One Health’research and application tool box. Veterinaria italiana, 45(1), 121-133.
https://health.ec.europa.eu/antimicrobial-resistance/eu-action-antimicrobial-resistance_pt